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Foto do escritorFábio Malavoglia

Ep. 51 - Passeio Ímã

Textos do Episódio


 

Langston Hughes

Jazzonia


Oh, silver tree!

Oh, shining rivers of the soul!


In a Harlem cabaret

Six long-headed jazzers play.

A dancing girl whose eyes are bold

Lifts high a dress of silken gold.


Oh, singing tree!

Oh, shining rivers of the soul!


Were Eve's eyes

In the first garden

Just a bit too bold?

Was Cleopatra gorgeous

In a gown of gold?


Oh, shining tree!

Oh, silver rivers of the soul!


In a whirling cabaret

Six long-headed jazzers play. ***

Langston Hughes

Jazzonia

tradução de Fabio Malavoglia Oh, selva em prata!

Oh, chamejantes rios da alma!


Há no Harlem um cabaret:

Seis cabeças afiadas tocam jazz.

A dançarina do olhar de gozo

Alteia a saia d’ouro sedoso.


Oh, selva em canto!

Oh, chamejantes rios da alma!


E de Eva

no jardim

era o olhar ousado assim?

E Cleópatra gozosa

se dourava no cetim?


Oh, selva em chamas!

Oh, prateados rios da alma!


Rodopia o cabaret

Seis cabeças afiadas tocam jazz.

 

Fabio Malavoglia Trigger

Ela morava no circo (era a cantora, a crooner) mas por alguma razão assinaria os papéis. Fácil não era e uma vez sem mais nem menos entrou numa de nossas reuniões com seu tubinho de franjas e o olhar debochado até fazer-me pedir que ela saísse dali mesmo que entrasse depois pelos meus sonhos no dia em que a encontrei no balcão branco fazendo a limpeza onde sentou e cantou só para mim todo o blues que terminava dizendo que prometia nunca mais “...a single wo-ord to youuuu...” vindo do fundo onde a alma dela me amava e eu a ela. E outra vez eu a vi numa reunião insisti “...mas como eu fui expulsa...” ela dizia e eu olhava perto sua face seu corpo a sua roupa colada cores de flores e a flor entre seus crespos cabelos até que inquieta largou tudo no meio e saiu e eu ainda a vi com sua amiga de longe nos corredores do circo – “Trigger!!!” – gritei mas perdi no labirinto de pano a doce pista da deusa de quem só achei uma ninfa negra que disse “não sei... veja se está por aí...”.


 

Fabio Malavoglia Comentário sobre “Trigger” ... E a procuro até hoje, por entre panos e cores, num labirinto que é circo, palco, plateia e arena... e que está dentro... e me espera. “Trigger”, seu nome, me intriga, já que engatilha em mim algo que ainda engatinha. Aparição fugidia, coisa que está por cumprir, busca secreta de tudo que eu não sei o que é, voz e dolente canção, e as pegadas deixadas perto do meu coração...

 

Jalal-ud-Din Rumi História do Amante e da Amada adaptação de Fabio Malavoglia

Bateu o Amante à porta de sua Amada. Uma Voz de dentro perguntou: - Quem é? E ele respondeu - Sou eu. Replicou a Voz então: - A casa é pequena para os dois. E a porta assim ficou fechada. O Amante se foi então para o deserto. Passado um ano, retornou. Bateu de novo à porta. Uma Voz de dentro perguntou: - Quem é? E ele respondeu: - É você. E foi a porta então aberta.

 

Fabio Malavoglia Solutio Torres trens viadutos vigas: tudo tule e tinta e tolos trouxas desse tonto engodo: a cena pintada no telão teatral a letal metrópole miragem do todo véu escuro e noite treva sobre treva tal qual uma névoa que o primeiro Sol... põe na luz e leve-a.

 

Eugenio Montale Forse un mattino...

Forse un mattino andando in un'aria di vetro,

arida, rivolgendomi, vedrò compirsi il miracolo:

il nulla alle mie spalle, il vuoto dietro

di me, con un terrore di ubriaco.


Poi come s'uno schermo, s'accamperanno di gitto

alberi case colli per l'inganno consueto.

Ma sarà troppo tardi; ed io me n'andrò zitto

tra gli uomini che non si voltano, col mio segreto *** Eugenio Montale Talvez uma manhã... tradução de Fabio Malavoglia Talvez uma manhã atravessando o ar que faz

-se vidro, ao me virar, verei o milagre cumprido:

o nada às minhas costas, o vazio atrás

de mim, com um terror de bêbado perdido.

Depois, como numa tela, armar-se-ão de repente

árvores casas colinas para o costumeiro arremedo.

Mas será tarde demais: irei embora silente

entre os homens que não se viram, com meu segredo.

 

Hermes Fontes A Fonte da Mata Depois de longa ausência e penosa distância,

vi a fonte da mata,

de cuja água bebi, na minha infância.

E que melancolia

nessa emoção tão grata!

Ver — constância das coisas, na inconstância…

ver que a Poesia é uma segunda infância,

e que toda Poesia…

Vem da fonte da mata…


 

Fabio Malavoglia

Na luz do raio

Poema da Praça Ramos

na trama do vale duro

de asfalto onde habitamos


problema para o futuro

daquilo que aqui amamos

na luz do raio o fulguro


na gema que cinzelamos

na pedra de uns versos puros

da Fonte que desejamos.

 

Fernando Pessoa

Guardo ainda como um pasmo...

Guardo ainda, como um pasmo

Em que a infância sobrevive,

Metade do entusiasmo

Que tenho porque já tive.

Quase às vezes me envergonho

De crer tanto em que não creio.

É uma espécie de sonho

Com a realidade ao meio.

Girassol do falso agrado

Em torno do centro mudo

Fala, amarelo, pasmado

Do negro centro que é tudo.

 

Fabio Malavoglia

Conversação

Há um ventre

e entrevado

nele um antro

e entrementes

introverso

há um dentro

de um dentro

que é o centro

de outro centro

onde encontro

me se ent

 

João Guimarães Rosa

Canção de Siruiz

Urubu é vila alta

Mais idosa do sertão

Padroeira minha vida

Vim de lá, volto mais não

Corro os dias nesses verdes

Meu boi mocho baetão

Buriti, água azulada

Carnaúba, sal do chão

Remanso de rio largo

Viola da solidão

Quando vou pra dar batalha

Convido meu coração


 

Salvatore Quasimodo

Ed è súbito sera

Ognuno sta solo sul cuor della terra

trafitto da un raggio di Sole:

ed è subito sera. *** Salvatore Quasimodo

E de súbito é noite tradução de Fabio Malavoglia

Cada um está só sobre o peito da terra

Crivado num raio de Sol:

e de súbito é noite.

 

Fabio Malavoglia

Desagravo

As Musas insultadas

por sórdidos doutores,

usadas como escadas

a cargos promissores!

Descei, severas fadas,

tomai os corredores,

com as poesias aladas

varrei computadores,

até que reste nada

que não vossos favores!

 


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