Textos do Episódio
Langston Hughes
Jazzonia
Oh, silver tree!
Oh, shining rivers of the soul!
In a Harlem cabaret
Six long-headed jazzers play.
A dancing girl whose eyes are bold
Lifts high a dress of silken gold.
Oh, singing tree!
Oh, shining rivers of the soul!
Were Eve's eyes
In the first garden
Just a bit too bold?
Was Cleopatra gorgeous
In a gown of gold?
Oh, shining tree!
Oh, silver rivers of the soul!
In a whirling cabaret
Six long-headed jazzers play. ***
Langston Hughes
Jazzonia
tradução de Fabio Malavoglia Oh, selva em prata!
Oh, chamejantes rios da alma!
Há no Harlem um cabaret:
Seis cabeças afiadas tocam jazz.
A dançarina do olhar de gozo
Alteia a saia d’ouro sedoso.
Oh, selva em canto!
Oh, chamejantes rios da alma!
E de Eva
no jardim
era o olhar ousado assim?
E Cleópatra gozosa
se dourava no cetim?
Oh, selva em chamas!
Oh, prateados rios da alma!
Rodopia o cabaret
Seis cabeças afiadas tocam jazz.
Fabio Malavoglia
Trigger
Ela morava no circo (era a cantora, a crooner) mas por alguma razão assinaria os papéis. Fácil não era e uma vez sem mais nem menos entrou numa de nossas reuniões com seu tubinho de franjas e o olhar debochado até fazer-me pedir que ela saísse dali mesmo que entrasse depois pelos meus sonhos no dia em que a encontrei no balcão branco fazendo a limpeza onde sentou e cantou só para mim todo o blues que terminava dizendo que prometia nunca mais “...a single wo-ord to youuuu...” vindo do fundo onde a alma dela me amava e eu a ela. E outra vez eu a vi numa reunião insisti “...mas como eu fui expulsa...” ela dizia e eu olhava perto sua face seu corpo a sua roupa colada cores de flores e a flor entre seus crespos cabelos até que inquieta largou tudo no meio e saiu e eu ainda a vi com sua amiga de longe nos corredores do circo – “Trigger!!!” – gritei mas perdi no labirinto de pano a doce pista da deusa de quem só achei uma ninfa negra que disse “não sei... veja se está por aí...”.
Fabio Malavoglia
Comentário sobre “Trigger”
... E a procuro até hoje, por entre panos e cores, num labirinto que é circo, palco, plateia e arena... e que está dentro... e me espera. “Trigger”, seu nome, me intriga, já que engatilha em mim algo que ainda engatinha. Aparição fugidia, coisa que está por cumprir, busca secreta de tudo que eu não sei o que é, voz e dolente canção, e as pegadas deixadas perto do meu coração...
Jalal-ud-Din Rumi História do Amante e da Amada adaptação de Fabio Malavoglia
Bateu o Amante à porta de sua Amada.
Uma Voz de dentro perguntou: - Quem é?
E ele respondeu - Sou eu.
Replicou a Voz então: - A casa é pequena para os dois.
E a porta assim ficou fechada.
O Amante se foi então para o deserto.
Passado um ano, retornou. Bateu de novo à porta.
Uma Voz de dentro perguntou: - Quem é?
E ele respondeu: - É você.
E foi a porta então aberta.
Fabio Malavoglia Solutio Torres trens viadutos vigas: tudo tule e tinta e tolos trouxas desse tonto engodo: a cena pintada no telão teatral a letal metrópole miragem do todo véu escuro e noite treva sobre treva tal qual uma névoa que o primeiro Sol... põe na luz e leve-a.
Eugenio Montale Forse un mattino...
Forse un mattino andando in un'aria di vetro,
arida, rivolgendomi, vedrò compirsi il miracolo:
il nulla alle mie spalle, il vuoto dietro
di me, con un terrore di ubriaco.
Poi come s'uno schermo, s'accamperanno di gitto
alberi case colli per l'inganno consueto.
Ma sarà troppo tardi; ed io me n'andrò zitto
tra gli uomini che non si voltano, col mio segreto *** Eugenio Montale Talvez uma manhã... tradução de Fabio Malavoglia Talvez uma manhã atravessando o ar que faz
-se vidro, ao me virar, verei o milagre cumprido:
o nada às minhas costas, o vazio atrás
de mim, com um terror de bêbado perdido.
Depois, como numa tela, armar-se-ão de repente
árvores casas colinas para o costumeiro arremedo.
Mas será tarde demais: irei embora silente
entre os homens que não se viram, com meu segredo.
Hermes Fontes A Fonte da Mata Depois de longa ausência e penosa distância,
vi a fonte da mata,
de cuja água bebi, na minha infância.
E que melancolia
nessa emoção tão grata!
Ver — constância das coisas, na inconstância…
ver que a Poesia é uma segunda infância,
e que toda Poesia…
Vem da fonte da mata…
Fabio Malavoglia
Na luz do raio
Poema da Praça Ramos
na trama do vale duro
de asfalto onde habitamos
problema para o futuro
daquilo que aqui amamos
na luz do raio o fulguro
na gema que cinzelamos
na pedra de uns versos puros
da Fonte que desejamos.
Fernando Pessoa
Guardo ainda como um pasmo...
Guardo ainda, como um pasmo
Em que a infância sobrevive,
Metade do entusiasmo
Que tenho porque já tive.
Quase às vezes me envergonho
De crer tanto em que não creio.
É uma espécie de sonho
Com a realidade ao meio.
Girassol do falso agrado
Em torno do centro mudo
Fala, amarelo, pasmado
Do negro centro que é tudo.
Fabio Malavoglia
Conversação
Há um ventre
e entrevado
nele um antro
e entrementes
introverso
há um dentro
de um dentro
que é o centro
de outro centro
onde encontro
me se ent
João Guimarães Rosa
Canção de Siruiz
Urubu é vila alta
Mais idosa do sertão
Padroeira minha vida
Vim de lá, volto mais não
Corro os dias nesses verdes
Meu boi mocho baetão
Buriti, água azulada
Carnaúba, sal do chão
Remanso de rio largo
Viola da solidão
Quando vou pra dar batalha
Convido meu coração
Salvatore Quasimodo
Ed è súbito sera
Ognuno sta solo sul cuor della terra
trafitto da un raggio di Sole:
ed è subito sera. *** Salvatore Quasimodo
E de súbito é noite
tradução de Fabio Malavoglia
Cada um está só sobre o peito da terra
Crivado num raio de Sol:
e de súbito é noite.
Fabio Malavoglia
Desagravo
As Musas insultadas
por sórdidos doutores,
usadas como escadas
a cargos promissores!
Descei, severas fadas,
tomai os corredores,
com as poesias aladas
varrei computadores,
até que reste nada
que não vossos favores!
Comments