CRIADAS E SERVIDORES
Textos do Episódio
William Butler Yeats
The Chambermaid's First Song
How came this ranger
Now sunk in rest,
Stranger with stranger.
On my cold breast?
What's left to Sigh for?
Strange night has come;
God's love has hidden him
Out of all harm,
Pleasure has made him
Weak as a worm. .........................
William Butler Yeats
A Primeira Canção da Criada
Tradução de Fabio Malavoglia
Tal qual veio, ora o vadio
Dorme e afunda no leito,
Cio de estranhos com cio.
No frio do meu peito?
O que ficou para um Suspiro?
Veio a noite inerme;
O amor de Deus lhe poupou
A dor em sua epiderme,
Pelo prazer se tornou
Mole como um verme.
William Butler Yeats
The Chambermaid's Second Song
From pleasure of the bed,
Dull as a worm,
His rod and its butting head
Limp as a worm,
His spirit that has fled
Blind as a worm.
.........................
William Butler Yeats
A Segunda Canção da Criada
Tradução de Fabio Malavoglia
Dos prazeres desse leito,
Imbecil como um verme,
A vara do intruso pleito
Frouxa como um verme,
O espírito em fuga desfeito
Cego como um verme.
Arthur Rimbaud Au Cabaret-vert Depuis huit jours, j'avais déchiré mes bottines
Aux cailloux des chemins. J'entrais à Charleroi.
- Au Cabaret-Vert: je demandai des tartines
Du beurre et du jambon qui fût à moitié froid.
Bienheureux, j'allongeai les jambes sous la table
Verte : je contemplai les sujets très naïfs
De la tapisserie. - Et ce fut adorable,
Quand la fille aux tétons énormes, aux yeux vifs,
- Celle-là, ce n'est pas un baiser qui l'épeure ! -
Rieuse, m'apporta des tartines de beurre,
Du jambon tiède, dans un plat colorié,
Du jambon rose et blanc parfumé d'une gousse
D'ail, - et m'emplit la chope immense, avec sa mousse
Que dorait un rayon de soleil arriéré. ......................... Arthur Rimbaud Ao Verde Cabaret tradução de Fabio Malavoglia Depois de oito dias rasgara as minhas botas
Nas pedras dos caminhos. Mas em Charleroi surgiu
- Ao Verde Cabaret: pedi torradas e uma cota
De manteiga e presunto que viesse meio frio.
Abençoado, estiquei as pernas sob a mesa,
Verde: e contemplava as ingênuas figuras
Da tapeçaria. - E era adorável a simpleza,
E a moça de olhos vivos e tetas de fartura,
- Aquela, não teria medo de um beijo! -
Ridente, me serviu torradas e o queijo,
E presunto morno, num prato bem pintado,
Presunto branco e rosa perfumado com um pingo
De alho, - e a cerveja e sua espuma onde respingos
de um raio de sol a tingiam de dourado.
A Sopa do Rei conto tradicional adaptação de Fabio Malavoglia Era uma vez um criado do palácio real que foi encarregado de servir a sopa no prato do Soberano. Mas, no momento em que ele estava tirando a sopa da sopeira, uma gota, de repente, caiu da concha e manchou o punho de seda da roupa do Rei, que ficou possesso:
– Com mil raios! Este cão não sabe nem servir uma sopa! – e gritando para o comandante da guarda ordenou: – enforque imediatamente este desastrado!!!
O rapaz, paralisado, ainda tentou balbuciar alguma coisa, mas o Rei estava fora de si:
– Quieto! Você vai pagar com a vida o que fez!
Então o criado, pálido, antes que os guardas o segurassem, simplesmente atirou toda a sopeira na cara do rei. Foi um Deus nos acuda! Duques e condes correram para ajudar o rei, que gritava, coberto de sopa e ferido na testa. O autor do atentado foi derrubado pela guarda real e arrastado à força para fora do salão, em direção do patíbulo. Na confusão, porém, o rei gritou: – Tragam esse homem aqui! (enquanto uma dama da corte tentava limpar seu rosto e a barba imunda, com um lenço perfumado).
O criado criminoso foi posto diante do rei, com violência, fizeram que se ajoelhasse. O rei perguntou:
– Louco! Eu te condenei à morte por uma gota e você ainda jogou a sopeira!!! Por que?
– Majestade – respondeu o infeliz, estranhamente calmo – se eu fosse enforcado por ter sujado sua manga, a fama de tirano o acompanharia o resto da vida, como o rei que matou um homem por causa de uma gota de sopa. Agora está tudo bem. Cometi um crime digno de morte. Ninguém dirá que o rei é injusto, impiedoso e cruel.
Fez-se um silêncio na sala. E depois o rei sorriu. E disse enfim:
– Você está certo, meu servo. Na minha fúria, tinha perdido toda razão. Teria me arrependido amargamente.
E assim o criado foi perdoado e, mais que isso, recompensado generosamente por suas sábias palavras. E até hoje, naquele reino, quando um juiz julga com excessiva severidade e rigor os pobres e os fracos, logo se ouve dizer:
- Aquele juiz está precisando que alguém lhe atire uma sopeira na cara!
Fernando Pessoa Servo sem dor de um desolado intuito
in Novas Poesias Inéditas. Fernando Pessoa. Lisboa: Ática, 1973. Servo sem dor de um desolado intuito,
De nada creias ou descreias muito.
O mesmo faz que penses ou não penses.
Tudo é irreal, anónimo e fortuito.
Não sejas curioso do amplo mundo.
Ele é menos extenso do que fundo.
E o que não sabes nem saberás nunca
É isso o mais real e o mais profundo.
Troca por vinho o amor que não terás.
O que esperas, perene o esperarás.
O que bebes, tu bebes. Olha as rosas.
Morto, que rosas é que cheirarás?
Vendo o tumulto inconsciente em que anda
A humanidade de uma a outra banda,
Não te nasce a vontade de dormir?
Não te cresce o desprezo de quem manda?
Duas vezes no ano, diz quem sabe,
Em Nishapor, onde me o mundo cabe,
Florem as rosas. Sobre mim sepulto
Essa dupla anuidade não acabe!
Traze o vinho, que o vinho, dizem, é
O que alegra a alma e o que, em perfeita fé,
Traz o sangue de um Deus ao corpo e à alma.
Mas, seja como for, bebe e não sê.
Com seus cavalos imperiais calcando
Os campos que o labor esteve lavrando,
Passa o César de aqui. Mais tarde, morto,
Renasce a erva, nos campos alastrando.
Goza o Sultão de amor em quantidade.
Goza o Vizir amor em qualidade.
Não gozo amor nenhum. Tragam-me vinho
E gozo de ser nada em liberdade.
30-11-1933
Paulo Leminski
Amar você é coisa de minutos Amar você é coisa de minutos
A morte é menos que teu beijo
Tão bom ser teu que sou
Eu a teus pés derramado
Pouco resta do que fui
De ti depende ser bom ou ruim
Serei o que achares conveniente
Serei para ti mais que um cão
Uma sombra que te aquece
Um deus que não esquece
Um servo que não diz não
Morto teu pai serei teu irmão
Direi os versos que quiseres
Esquecerei todas as mulheres
Serei tanto e tudo e todos
Vais ter nojo de eu ser isso
E estarei a teu serviço
Enquanto durar meu corpo
Enquanto me correr nas veias
O rio vermelho que se inflama
Ao ver teu rosto feito tocha
Serei teu rei teu pão tua coisa tua rocha
Sim, eu estarei aqui
Florbela Espanca
Escrava Ó meu Deus, ó meu dono, ó meu senhor,
Eu te saúdo, olhar do meu olhar,
Fala da minha boca a palpitar,
Gesto das minhas mãos tontas de amor!
Que te seja propício o astro e a flor,
Que a teus pés se incline a terra e o mar,
P’los séculos dos séculos sem par,
Ó meu Deus, ó meu dono, ó meu senhor!
Eu, doce e humilde escrava, te saúdo,
E, de mãos postas, em sentida prece,
Canto teus olhos de oiro e de veludo.
Ah, esse verso imenso de ansiedade,
Esse verso de amor que te fizesse
Ser eterno por toda a Eternidade!...
(palavras de Alce Negro) in « Alce Negro fala », John G. Neihardt, Lisboa : Antígona, 2000
“A paz... entra nas almas dos homens quando eles se dão conta de sua relação, sua unidade, com o universo e todos os seus poderes, e quando se dão conta que no centro do Universo mora Wakan-Tanka, o Grande Espírito, e que este centro está realmente em todas as partes, está dentro de cada um de nós... Este conhecimento não pode ser obtido a menos que exista uma perfeita humildade, a menos que o homem se humilhe diante da criação inteira, diante da menor formiga, tomando consciência de seu próprio nada. Somente sendo nada pode um homem chegar a ser tudo, e só então toma consciência de sua irmandade essencial com todas as formas da vida. Seu centro, ou sua Vida, é o mesmo centro ou Vida de tudo o que é”.
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